quinta-feira, 15 de abril de 2010

Sinais

Música: And The Bells Are Ringing Doom
Artista: Weh (Noruega)
Informações: www.weh.erikevju.com



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Sexta-feira santa, sábado de aleluia e domingo de páscoa. A trilogia de Jesus dos cristãos, o cara que não é o deus de Eferson. No entanto, assim como eles, foi hipócrita e se entregou – sem remorso - a gula de peixes, vinho e chocolates. E com a vantagem de não perder tempo rezando ou pensando em historinhas bíblicas.

Eferson perdeu a fé ainda na adolescência, quando definitivamente entendeu que foi ele próprio que pavimentou os então 16 anos e estava com as ferramentas e argamassa necessária para edificar o presente. De criador a criação. É assim que o garoto define sua relação com os deuses e seres imaginários do universo religioso.

Descobriu que datas como Páscoa e Natal ganhariam novos significados, melhores do que enquanto amarrado pelo catolicismo. Não mais precisava rezar, agradecer ou pedir coisa alguma na hora de receber presentes e comer chocolates. Todos os prazeres eram frutos de seu caráter, seu esforço e independia de benevolência divina.

Era a ânsia de viver pulsando em suas entranhas. Era a urgência de sentir-se enfim de carne e osso, passível de rir, chorar, amar, sofrer e idolatrar quem de fato é importante para sua existência. “Eu existo”, branda de punhos cerrados, como um gesto de condolência ao ar que respira, ao chão que pisa e à comida que o alimenta.

Deus algum o manda trabalhar para receber pelas horas pagas àquele que o explora, assim como não perderá mais um minuto da sua existência para “conversar” com o nada. O tempo é escasso e quer exprimi-lo com outros seres humanos que lhe conforta. Hoje sente-se bravo para sucumbir ao acaso. Prefere morrer de pé a viver de joelhos.

Em nome da família, dos amigos e da vida. Hail!

terça-feira, 30 de março de 2010

Música: "The isle of summer"
Artista: Agalloch (Estados Unidos)
Informações: www.myspace.com/agalloch



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Oi, Cecília, como vai? Parei de trabalhar por um momento para te escrever. Ah, sim, está tudo bem, as pautas atendidas, entrevistas realizadas e parágrafos fluindo com naturalidade. Claro, já foram dois copos de café, conversa informal com o pessoal do jornal e bisbilhotadas no e-mail particular. É, recebi um ou outro, mas nenhum que realmente esperava ou que me surpreendeu.

Hoje vi umas fotos. Não, não minhas, de pessoas quaisquer, que assim como eu - e você - registraram certos momentos da vida. São fotos reveladas em papel, que até já estavam amareladas e confesso que acho este “efeito” bacana, como se o envelhecimento natural das coisas fosse capaz de legitimar a lembrança. Como se o dono da foto falasse “olha, isso faz tanto tempo! E ainda me recordo do dia em que foi fotografada”. Penso que gostaria de fotografar cada movimento, cada risada e cada trapalhada da minha vida. Sabe? Estamos crescendo e este processo também é passível de memória.

Mas não é simples assim, viu, Cecília. Quando vejo fotos como estas, de experiências de outras pessoas, sinto que tenho lembranças semelhantes, mesmo não fotografadas e me emociono, principalmente nas de fatos cotidianos. Sei lá porque, é quando prefiro conceber ideias no campo do sentimentalismo barato. Típico, eu sei, mas você deve levar em consideração que os anos passam, as memórias amarelam e enlouquecemos para que haja um pingo de nitidez em coisas cujos elos estão fracos.

Lembra de quando passeávamos de carro pela cidade, sem destino, sem propósito? Então, Cecília, é disso que eu falo. O corriqueiro de ontem e a saudades do hoje. Mas olha, estou te atrapalhando? Você sente algo parecido com coisas do passado? Ontem mesmo, de noite, fui deitar e queria musica. Fiquei um tempo em frente aos meus CDs, procurando algo que soasse lisérgico e atmosférico. E aí eram tantos... e cada um com uma história. Lembra, como eu me dedicava a ler sobre lançamentos e escutá-los? Mas então, demorei e não achei, porque eu queria todos ao mesmo tempo.

E é assim que me vejo em certos dias. Um computador com infinitas informações que entra em pane na tentativa de solucionar uma questão aparentemente fácil. É quanto peço ajuda aos amigos imaginários, que, no entanto, são todos uma só pessoa, eu. E percebo que tenho, sim, as respostas, sei os caminhos certeiros, mas antes trilho os mais complexos. Isso me lembra do verão de 2000, numa tarde com brincadeira de bola no quintal de sua casa. Lembra? Quando você a chutou forte contra o muro, girou o corpo e me abraçou, permanecendo assim por alguns minutos? Sem palavras e sem porquês daquele jeito ficamos.

Naquela tarde, imaginei mil coisas, mas sabia a única razão. Hoje, sinto saudades daquele abraço, dos “bons tempos”, mesmo complexos. Quando precisávamos de mais distorção, quando sentíamos o frescor das coisas e que, sim, nos lembraríamos sempre daqueles anos. Talvez você precise de fotos amareladas para ativar algumas memórias, mas sabe que a intensidade de outrora foi doce o bastante para guardar, até hoje, o sabor da adolescência.


segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Música: "Science Books"
Artista: Arrah and the Ferns (Estados Unidos)
Informações: www.myspace.com/arrahandtheferns



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Tudo ao meu redor. Percepção aos mínimos detalhes e ganas para experimentar cada vibração.

A potencialização do ser. A violência da urgência em injetar energia o suficiente para satisfazer o saber da vida em redenção.

Outros legitimam a existência espiritual por um pedaço de pão dito abençoado. Nós legitimamos a lucidez física dialogando com propriedades naturais da ciência.

sábado, 30 de janeiro de 2010

Sobre ilustrar

Música: "Gentle Moon"
Artista: Sun Kil Moon (Estados Unidos)
Todas as estrelas podem brilhar, assim como todos os corações podem ser aquecidos. Desolado em meio ao caos da cidade, em uma noite em que o congestionamento passou das dezenove horas, ele nada mais tinha o que fazer enquanto esperava o alívio no trânsito. Era apenas ele e o céu. Lá em cima, naturais pontos luminosos no azul escuro da noite. Aqui, em terra firme, frenéticos pontos luminosos artificiais. Estava entre a contemplação e a obrigação.

Sabe que, segundo contos urbanos, uma estrela que o indivíduo vê no céu pode já não mais existir. É a tal diferença anos luz entre os acontecimentos do universo e o movimento da Terra. Pensa que é capaz de ainda conseguir ver o ponto de luz sumir, de tanto tempo que está e ainda permanecerá em meio a carros, ônibus, caminhões.

As lanternas dos veículos - e da cidade -, incessantes, o faz subverter os aprendizados científicos. A estrela ainda brilha diante os olhos e isso é o que importa. Para o resto do universo, está morta. Para ele, ela ainda é charmosa, viva, capaz de lhe roubar instantes de atenção. Mesmo distante, o brilho chegou ao íntimo.

Então quis manter o foco naquela estrela, tão distante dos olhos e, ao mesmo tempo, de brilho tão intenso que é capaz de aquecer o coração. O exercício deve ser eterno, sem ruídos alheios, sem devaneios. A estrela nunca morrerá, é o que roga, é o que almeja para que, assim, possa seguir viagem.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Espírito livre

Música: "The enigmatic spirit"
Artista: Vintersorg (Suécia)
Informações: www.myspace.com/vintersorganic





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O portão abriu e lá de longe ele viu o vento o empurrando para o lado de fora. Havia música no movimento do vento. Ele, estático, apenas observava. Mentalmente aproxima o olhar daquela cena, o portão lentamente se abrindo e deixando o horizonte à vista. A saída para o mundo, as possibilidades além da visão. Ele, estático, vislumbrava.

O sopro do vento soava em seus ouvidos, media força com seu corpo. O vento, bravo guardião da incerteza ou o mensageiro do amanhã? Ele, ainda estático, fecha os olhos e, às escuras, enfrenta a natureza. Sem armas, sem argumentos e sem planos. Nem mesmo a carne lhe era necessária, pois já está concentrado em pensamentos. E ainda estático.

O curso do vento é o atalho para, estático, atingir a redenção além das fronteiras visíveis. Quebra a simetria da lógica, desafia a alquimia dos antigos e se transforma numa energia amorfa, oriunda da catarse humana. É a peça que se desencaixa do quebra-cabeça planetário e instaura-se como a falha no perfeito plano divino.

Insólito. O portão permanece aberto e o vento continua a soprar produzindo música. E ele marcado pelo choque com as forças naturais que o tirou o ar e devolveu, mutilou a sensibilidade, abriu feridas e as secou, desvirtuou suas visões e processou mil realidades diante seus olhos em frações de segundos.